domingo, 20 de março de 2011

Anatomia do medo
Pedaços de literatura
Nubor Orlando Facure



Historias reais ou inventadas sobre situações de medo que nós todos conhecemos:
1 - Paralisadas pelo medo
As meninas voltavam à noite do cursinho quando escutam um barulhão de coisas caindo. Elas simplesmente paralisam sem qualquer ação. O medo lhes inibe qualquer iniciativa. As pernas tremem, quando, de repente, ouvem um grito estridente e um frio risca as suas costas - já estavam sem respirar por uma eternidade e os “sentidos” pareciam flutuar sem garantir se ficam ou se vão de vez - quando menos esperam, um vulto passa correndo, aos saltos - num relance perceberam que era apenas um moleque roubando frutas o causador de toda encrenca.

2 - O coração salta na boca
Calmamente o pai breca o carro na esquina esperando o sinal. Ninguém da família percebeu o taxi que vinha correndo atrás e, não tem tempo para brecar. A batida é estrondosa, o grande susto põe o coração de todo mundo pra correr, saltando do peito para pulsar na boca, até que as coisas se esclareçam

3 - A expressão não deixava duvida
Noitinha escura, sem luar, Genildo volta tarde para a pensão onde mora. Trabalha nos Correios na cidade do Prata em Minas Gerais. Os pais ficaram na fazenda Modelo em Uberaba - são idosos e não podiam acompanhar o filho quando mudou pro Prata. O rapaz aproveita o tempo disponível para fazer a noite um curso de informática. Na esquina da Rua São Benedito o casarão tem só uma moradora, idosa, viúva há muitos anos e, com tanta maldade no coração que os 6 filhos a deixaram, indo em busca de trabalho em São Paulo - andavam dizendo que, de uns tempos pra cá, a casa está assombrada. Nessa noite, Genildo, que dizia não ter medo dessas coisas, escuta ruídos na casa e se propõe a conferir. Como não vê nada pela frente, decide conferir nos fundos do quintal. A escuridão não lhe permite ver onde pisava, mas, coincidência ou não, a luz pisca sem parar, e ele ao virar torce o pé, cai sem conseguir se levantar e, um vulto masculino aparece e desaparece, indo e vindo a sua frente. Genildo nunca mais quis falar disso, mas, sua expressão era de ter visto mesmo o fantasma do velho, dono do casarão

4 – Os olhos pareciam saltar do rosto
As meninas assistiam na televisão mais um capítulo da série Assombrações. Todas disfarçavam uma dose maior ou menor de medos das “aparições”. Mariana contou que sempre sonhava com essas imagens quando via o filme. Renatinha, também, confessava que dormia com medo e qualquer barulho à noite a prendia na cama até a manhã seguinte. Outras se lembravam de cenas dos filmes mais antigos e, de certa maneira, medo e silêncio andavam juntos fazendo com que cada uma fosse para cama sem se despedirem. Subitamente, a madrugada escura e fria é cortada por uma crise de “terror noturno” vinda do quarto da Vanessa. Todas que correram para acudir tiveram a mesma impressão: os olhos saltados no rosto pareciam enxergar os mesmos fantasmas do “assombrações”



5 - O sobressalto inesperado
Todo menino tem uma irmã cri-cri. Marquinhos pesquisava no computador: Revolução francesa. Nomes difíceis, Robespierre e Diderot. Já era noite e o assunto lhe parecia chato e tenebroso - afinal cortaram a cabeça de milhares, uns pró e outros contra o governo. Cansado, não percebeu que a Irmã vem devagarzinho por traz e dá um grito, na verdade um berro. Não deu outra, computador, livros e cadernos foram pelos ares num só pulo

6 - O borra botas
No tempo antigo, lá nas roças de Minas Gerais, sobraram alguns negros que a escravidão acostumou com a obediência e o servilismo, morando, agora, a troco de casa e comida. Um pedaço da família de Nego Bentinho ficou morando no retiro perto do pocinho entre o buritizal e a plantação: milho de um lado e mandioca do outro. Ficava em casa só a "neguinha", menina magrelinha, de 14 anos, num sabia ler, andava descalça, limpava um pouco a casa e recolhia as roupas do varal, esticando aquela magreza de pernas.
Um dia "neguinha" parecia ter sumido de casa. Não havia como ter notícia, o jeito era sair procurando - uns gritando prum lado e outros chamando a negrinha nos escondidos dos matos.
Ouvindo um gemido, a coitada foi achada chorando de fazer pena, mas a voz não saia, de tanto soluço. Só mais tarde ficaram sabendo que ela fora abusada.
Passaram-se mais de 5 meses quando, nas descidas do morro de onde se podia ver uma pontinha da Canastra, um cavaleiro, voltando à tardinha pra casa é apeado a força por 3 negros.
Ninguém fala uma palavra sequer. Eles se conhecem “de vista” - o branco trabalha na sede da Fazenda do seu Borginho com os privilégios que o patrão lhe dá - acostumado a distribuir ordens e fazer o que bem quer.
Com agilidade e força o cavaleiro é amarrado a um tronco. Coitado - respiração ofegante, coração disparado, suor encharcando tudo de cima em baixo, olhos esbugalhados, e só se via aquelas pupilas negras dilatadas ao extremo. O rosto contraído parecia ter um riso nervoso pedindo explicação. Não tinha mais como saber onde estavam suas pernas nessa hora. Pensar em correr? As cordas apertavam e as pernas não obedeceriam mais. Talvez ele tivesse pensado em Santa Rita pedindo proteção.
O que esses negros queriam? Que levassem o cavalo, afinal, ele nunca carregava nada de valor. Ou, que o matassem logo. Não havia como entender o porque de tanto suplício.
De repente um negro tira uma faca e corta-lhe o cinturão de um único golpe. As calças arreiam até às botas expondo as pernas brancas, peludas e, agora, escorridas de urina e fezes. Numa hora dessas as fezes são expulsas amolecidas por toda água que sai junto. Mal cheiro insuportável e, em minutos, está tudo misturado com sangue. Os negros eram acostumado a castrar o gado. Capavam um porco com dois golpes no meio daquele grunhido estridente. Era preciso observar um mínimo de técnica para não serem cortadas as artérias que poriam a vida em risco. No perverso que deflorou a "negrinha" o cuidado foi o mesmo - nada de matá-lo numa loucura dessas. Era preciso desfrutar da humilhação. Tinha de servir de exemplo e, o povo todo ia saber que por muitos anos a região da Canastra estava livre desse tarado.
Demorou mais de 2 anos pra "neguinha" voltar a falar, ver gente estranha nem pensar e, parece que casou com um primo que a levou para Uberlândia onde tiveram filhos.

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