domingo, 23 de fevereiro de 2014

Nossos "campos" psíquicos

Nossos “Campos” psíquicos
Nubor Orlando Facure

Não há palavras que preencham o espectro inteiro das nossas experiências psíquicas. Usei o termo “campos” aleatoriamente. A neurologia usa níveis de consciência, a psicologia fala em expansão da consciência, a psicanálise em limites do inconsciente e filósofos  em cisão da personalidade.
É fácil de se perceber a ação dos fenômenos  que nos afetam fisicamente – você toca a panela quente no fogão, queima as pontas dos dedos e sente subir uma dor atroz insuportável.
Num exemplo simples como esse, podemos perguntar: o que acontece internamente em nosso psiquismo?
Ha uma dor física registrada no cérebro e a reação emocional de uma dor psíquica: dor que irrita, causa sofrimento, raiva, revolta, sentimento de vingança ou, toleramos o incômodo e deixa passar.
No dia a dia nos vemos trabalhando, estudando, transitamos pela cidade enfrentando mil dissabores, compromissos familiares com filhos e esposa – e mal damos conta das reações físicas e psíquicas que nos atinge continuamente. Em todas essas situações nossos “campos” psíquicos estão ativamente funcionantes.

Didaticamente distinguimos 4 “campos” psíquicos que apontaremos a seguir, destacando sua anatomia simplificadamente:

A consciência:

A consciência pode ser aceita como uma função, uma posse de determinadas competências ou, uma propriedade do complexo cérebro/mente mas, classicamente é tratada como um “estado” – modo de estar, situação, condição – Consciência é um estado de alerta que mantém desperto nosso tônus psíquico.
A Consciência normal é preenchida por um conteúdo fornecido pelo ambiente e pelo meio interno nosso corpo, nosso organismo. Ela só é completa quando estão ativas a atenção, as memórias e a linguagem. Os quadros patológicos são interessantíssimos, certos pacientes apresentam-se conscientes mas, sem conteúdo e, outros, não tem consciência da presença de uma parte do seu corpo – nas chamadas heminegligências o doente não reconhece como seu a metade esquerda do seu corpo, ela o incomoda como um intruso ao seu lado.

O INCONSCIENTE:

Depois de Freud o termo inconsciente merece ser escrito em letras maiúsculas. Ele remodelou o nosso psiquismo como Copérnico revolucionou o firmamento e Darwin determinou a posição do homem na escala animal.
O Inconsciente de Freud é descrito exaustivamente como uma entidade a parte, construída por desejos censurados e reprimidos, inaceitáveis socialmente, criando situações insustentáveis para o indivíduo, permitindo eclodir manifestações neuróticas de diversos coloridos.
Não importa o quanto Freud é hoje aceito ou rejeitado – nossa mente não é mais a mesma depois dos fatos que ele escarafunchou revelando dentro de nós um mundo promiscuo e incestuoso – é claro que a sociedade se escandalizou, mas nada foi tão chocante e pior que a pequenez que a psicanálise nos posicionou, inferiorizados nas tomadas de decisões que sempre imaginamos ser do nosso completo domínio consciente – puro engano, somos traídos por desejos proibidos, inconscientes, na maioria das vezes.
O inconsciente  da psicopatologia constrói quadros clínicos variados – expressões de neuroses diversas, quadros grotescos nas paralisias e contorções histéricas, sintomas sutis de anestesias nalguma parte do corpo e perversões  libidinosas criativas.
Não é preciso mergulharmos em exemplos doentios, o que escandaliza a sociedade é percebermos em nós mesmos os sonhos confusos, os atos falhos, os sintomas neuróticos disfarçados, especialmente nos chefes déspotas, nos pais autoritários, nas tias solteironas exigentes, nas mães condescendentes, nos maridos dominadores, nos filhos agressivos – melhor saber que desse inconsciente indomável nenhum de nós tem como escapar.

Subconsciente:

É assustador o que a literatura vulgar e pseudocientífica tem publicado sobre o papel e poderes do nosso subconsciente, é melhor não perdermos tempo com isso.
Pierre Janet, um dos gigantes da escola francesa de Charcot, tentou fazer com o subconsciente o que Freud conseguiu com o inconsciente. Nas crises histéricas ele fala numa cisão da personalidade com manifestação do subconsciente. Pierre Janet foi muito confuso na apresentação da sua teoria, não conseguindo o sucesso de Freud.
Na psicanálise o subconsciente é uma região intermediária entre a consciência e o inconsciente. Haveria uma comunicação mais pronta entre os dois, sem os conflitos incômodos, reprimidos no inconsciente

O Magnetismo e o subconsciente

Foi  Mesmer (1779), que introduziu, em Paris, a aplicação do magnetismo animal,  produzindo as “crises” denominadas de crises  mesméricas, para tratamento de suas pacientes.
Nessas crises, ocorria um franco estado torporoso, que seu discípulo, Marquês de Puysegur denominou de sonambulismo, foi daí em diante que se difundiu o termo “crise sonambúlica”.
Nessas situações de sonambulismo provocado, ficou claro a manifestação de um novo conteúdo mental constatado no paciente em crise e, que demonstrou-se tratar-se de um conteúdo subconsciente, já que uma vez desperto o paciente não mais o possui.
O caso emblemático de exposição do subconsciente ocorreu em Maio de 1784 na propriedade rural de Puysegur. Um jovem de pouco mais de 15 anos, Victor Race, foi magnetizado para tratamento de uma dor nas costas – ele era pastor de ovelhas – durante o transe ele falava com um palavreado superior a sua condição cultural, manifestou capacidade de clarividência e colaborava com Puyseguir revelando moléstias internas nos demais participantes dos experimentos com o magnetismo. Foi dando uma determinada ordem ao garoto que Puysegur descobriu a existência de um fenômeno extraordinário que chamou de sugestão pós-sonambúlica – uma vez desperto do transe sonambúlico o garoto cumpria as ordens que Puysegur lhe havia determinado.

Inconsciente neurológico

Usei esse termo para me referir a uma série de competências do nosso cérebro para realizar tarefas sem a participação ostensiva da consciência.
Classicamente os mais conhecidos são os automatismos motores – podemos caminhar, digitar, tocar o violão, dirigir o automóvel, andar de bicicleta e mesmo atividades simples como pentear o cabelo, escovar os dentes, virar as páginas de um livro, acender um cigarro, fazer um tiauzinho com a mão, jogar um beijo, estender a mão para cumprimentar.
Atividade sensitiva também pode ser subconsciente – estou assentado e a pressão da cadeira me faz mudar constantemente de posição sem me dar conta do que está acontecendo, a explosão de um foguete me faz virar rapidamente a cabeça para o lado do barulho
As funções cognitivas de caráter emocional são frequentemente inconscientes – O artilheiro chuta o pênalti na trave, há um lamento geral percorrendo a arquibancada. Uma martelada no dedo me solta um grito de dor e um palavrão. Cruzo apressado com um amigo e aquele “olá, tudo bem” sai automaticamente sem comando da consciência.

 



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